Apresentação

Para quem curte poemas, contos, lendas e histórias, aprecia uma boa música e é apaixonado por arte, aqui é um ótimo lugar para encontrar tudo isso de uma única vez. Seja bem-vindo!

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O Banco (Conto-Crônica)

      O banco mora na pracinha daqui da frente. Meio isolado de tudo, ele é como um ponto de ônibus onde não passa ônibus: vazio. Tenho a impressão de que ele se incomoda um pouco com a situação da sua "casa" - assim chamaremos. Uma escadaria cheia de entulho, árvores que dão frutos de vez em nunca, o ar poluído - não da cidade grande, mas da vila de classe média. Não que seja um lugar feio, talvez um pouco mal cuidado. Mas, tudo bem, admito que a vista, por vezes, é até que agradável.
      E esse velho morador da vila já tem vários e vários anos de (não) vida. Já foi realmente ponto de ônibus, já foi parada de banca de jornal, já foi, inclusive, um dos lugares que meu cachorro gostava de visitar quando ia "dar uma voltinha" na rua. Hoje, ele é apenas um banco.
      Feito de concreto mesmo, é bonitinho. Simples, com uma leve curva em sua superfície. É bom para descansar. Aliás, acho que é exatamente assim que as demais pessoas pensam. Meus vizinhos, sabe?! Aqueles que eu não sei o nome e tampouco a cara. Mas devem ser eles os vizinhos. Sim, porque ora ou outra, quando eu olho pro banco, eu vejo algum deles lá. Duas mulheres de meia idade conversando, contando as fofoquinhas da família, dos antigos conhecidos de longa data, quando começaram a ser amigas. Um homem macambúzio que chega todo cansado para apoiar as tantas sacolas num pedacinho do banco e dar um descanso aos braços, e também às pernas, que carregam ele há tempos do mercado até ali. Um casal de namorados que aproveitam a hora de folga para sentir o toque de uma mão carinhosa e poder desabafar um pouquinho e ainda serem amados. 
      E tem também, não menos importantes para o banco, os desconhecidos. A família que vem de não sei aonde para fazer exames no postinho de saúde daqui de perto e não pensam duas vezes em dar uma paradinha para esticar o corpo. Ou os meninos e meninas que surgem gritando, depois do período escolar, sempre com aquelas brincadeiras saudáveis - até certo ponto.
      Já chegou a acontecer de um pobre coitado parar pra dormir no banco. Um bêbado magrelo, presumo morrendo de fome, que fugia de uma surra e procurava um cantinho. Mas praça na frente da minha casa não é lugar pra mendigo viver, logo chega alguém pra expulsar ele de lá.
      Mas fora isso, a vida agitada e prestativa do banco acaba sendo uma vida solitária. Quando não tem ninguém lá, ele fica paradinho, sentindo o vento bater, rachando com o calor do sol, se molhando inteiro nos dias chuvosos e ficando surdo de tanto ouvir o ir e vir dos carros e das pessoas.
      Ele é um velho sozinho, que de vez em quando encontra uma companhia de alguns minuto. E é também um velho sábio, que conhece a vida e as necessidade de todo mundo. E se não fosse pela minha preguiça de ficar aqui do outro lado da rua enquanto olho pra ele, o coitado do velho poderia, até, estar me ajudando a contar melhor a própria história. Mas deixe assim como está, porque lá vem mais duas que notaram a importância do banco, e eu, bem, eu não quero incomodar.
 

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Ímã

Depois que começa
Ninguém quer parar
É sempre assim, um vício
Que tentamos ao máximo evitar

A coisa te chama
E seu corpo não repele

A coisa te ordena
E a mente obedece

A coisa te anima
E a alma escapa da pele

Ah, que coisa
Ela nunca te aborrece

Depois que começa
Ninguém quer parar
É sempre assim, um vício
Que tentamos ao máximo evitar
Mas vê se você consegue
Fazer parar o atrito
Do lápis no papel...
Samanta Geraldini

Em Paradoxo

Eu tive todo o tempo do mundo.
Dias, meses, anos...
E deixei tudo para depois.

Deram pra mim uma caixa sem fundo
Cheia de planos
E eu os ignorei, pois

Um não me era o bastante
E dois já pareciam demais.
Assim como seria, não obstante,
Um par ímpar de pais.

Me deram um livro para ler,
Eu queria escrever;
Me deram papel e caneta
E eu os guardei na gaveta.

Me mostraram uma tela impressionista,
Eu fugi, querendo enganar a vista;
Me mostraram a realidade
E eu desmenti a verdade.

Me pediram pra sair de casa,
Eu preferi uma socialização rasa;
Me pediram pra encarar a solidão
E eu chorei, em total depressão.

Fui do contra e resisti,
Fiz tudo o oposto do que deveria.
Mas chegou uma hora que eu desisti
E voltar atrás era o que eu queria.

Mas já era muito tarde
A vida chegava ao fim
E uma voz veio me dizer:

"Agora deixe, não faça alarde,
Pois terminar a história assim
Não vai te ajudar a resolver."

Mas eu sou do contra mesmo
Em paradoxo, um paradoxo!
Peguei a caneta e o papel da gaveta
E vim escrever!
Samanta Geraldini

Versos de Elã

Oh! pobre poeta,
O que te inspira?
Qual é a sua meta?

A vida no campo,
A água do rio,
Montes floridos
E o céu cor de anil?

Ou a cidade
De cor cinzenta,
Fumaça rolando
E gente sedenta

Por dinheiro,
Por trabalho,
Por uma casa
E meia família?

Oh! nobre poeta,
Por que suspira?
Perdeu sua meta?

Já se foi seu amor
De olhinhos brilhantes;
Foi-se também seu humor
E tudo era como antes?

Ou ainda vive
Aí em teu peito
Um amor doentio
Que é dito e feito

Por dor,
Por saudade,
Por carência
E uma lágrima?

Poeta! Oh, poeta!
Eu sou como tu.

Eu enxergo em meio a arranha-céus
O mais puro e belo luar.
E nas estrelas lá do longe
Eu procuro alguém a me olhar.

Pois não careço de nada concreto,
Só a lembrança me satisfaz
E quando encontro a inspiração certa
O mundo, em minhas palavras, se faz e desfaz.

Samanta Geraldini

domingo, 3 de agosto de 2014

Lanchonete (Sanjuuichi)

Me vê um sanduíche!
- Pastel de piche?
Não, pão com recheio.
- Ah...

Prepara,
Serve.
Comenta:

- Bela caneta, senhor!
Amor de escritor?
Claro! Já viu poeta de tinteiro cheio?

---

Me vê uma mostarda!
- Se o almoço não tarda?
Não, quero condimento.
- Ah...

Prepara,
Serve.
Comenta:

- Belo caderno, senhor!
Amor de escritor?
Claro! Já viu poeta versar no vento?

---

Me vê um café!
- Quer um canapé?
Não, só cafezinho.
- Ah...

Prepara,
Serve.
Comenta:

- Bela pedida, senhor!
Amor de escritor?
Claro! Já viu poeta escrever sozinho?

(Vai embora)

---Betsu no hi (outro dia)---

Me vê qualquer coisa!
- Qualquer coisa, mesmo?
Sim, isso!
- Ah...

Pensa.
Pensa.
Pensa!

Traz um sanduíche
com muita mostarda
E um copo de café.

- Não é por nada não,
mas eu sei que isso
te inspira mais do que mulher!

Samanta Geraldini

(A)Manhã

Eu tenho sono,
Eu tenho frio,
Nem o sol acordou tão cedo.

Eu tenho pressa
E tenho arrepios
Ao lembrar da época em que tive medo

De te olhar pela manhã
E não poder te abraçar.
Saber que você também queria isso,
Mas era surreal demais pra acreditar.

Sonhos,
O quão longe vocês estão da realidade?

Hoje minha realidade diz que estou sonhando.
Mas parada aqui
A te esperar
Sem medo
Minha mente e o meu coração dizem:
Eu estou te amando!
Samanta Geraldini

*Em 02/08/2014 às 07:40, para o meu Kevin

Era Uma Vez...

A fantasia me invadiu,
Parou e sorriu.
Coloriu meu céu,
Serviu-me de véu
E vestiu meu humor
Como cartas de amor.
Então de longe enxerguei
Todos aqueles
Que eu imaginei
Que pudesse ser você:

Meu herói, meu vilão,
Um principe encantado,
Um rei sem coração
Ou meu eterno namorado?

Seria Aladdin?
Seria um plebeu...
Ou até mesmo um demônio!
Mas se fosse Eros
Ou o lindo Romeu
Me concederia esse Amor Platônico?

Se quisesse poderia ser
Um dos quarenta ladrões.
Mas por que não um profeta
Ou um domador de dragões?

Que tal um palhaço?
Talvez poeta?
Ou, quem sabe, um cozinheiro?
Plantaria flores
E colheria pétalas
Se fosse o meu jardineiro.

Se escolhesse ser Deus
Ou meu Anjo da Guarda...
Se quisesse ser ilusionista
Ou um guerreiro de Esparta...

Diria até
Que pode ser um desenho
Ou um bichinho de estimação.
Mas vou optar
Por ser meu modelo
Que vem desfilando com meu coração.

Que simplesmente
Se veste de si:
Sem trajes
Sem estórias
Sem nenhuma falsidade.

E permite que o tempo
Lhe deixe dizer
Que atrás de ilusões
Não irá se esconder.

Pois a fantasia serena
Quando passada à penas
Nessas folhas em branco

Não faz mais sentido,
Meu mais que amigo,
Pois não é amor, é encanto.
Samanta Geraldini